sábado, 16 de fevereiro de 2013

No terraço existencial

Está na hora de retornar ao terraço existencial
Contemplando a solidão da Lua
E, ao contemplar a imensidão,
percebo que também sou Lua.

O carnaval em mim se foi
Quando, talvez, nunca tenha sido.
E a carta que deixa é o pó
Que amedronta de destruição os sonhos vivos.

Não quero mais pensar em dor
Excluí-las-ei por decreto,
Ainda que abdicando de sinceridade.

Não tenho opções saudáveis a escolher,
Mas permaneço em vigília pela vida...
E, nas entranhas, a cultivarei eternamente.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Filosofia Clínica: uma Filosofia Aplicada



A Filosofia Clínica parte do pressuposto de que não há pressupostos na existência humana. Investe no princípio de unicidade humana, em que o individual é valorizado em detrimento dos chavões comuns e da "ditadura" subliminar de uma ética comportamental para todas as pessoas.

Inicialmente, os estudos da personalidade do partilhante, como é chamado aquele que leva suas questões existenciais, angústias, etc., ao Filósofo Clínico no consultório, são extraídos a partir da historicidade do indivíduo, que é estudada minuciosamente para que haja uma espécie de "banco de dados" que possam ajudar o profissional a entender as motivações do partilhante, seu universo, sua estrutura de pensamento, suas angústias, suas crenças, enfim, tudo o que é pertinente e que seja possível entender através do conhecimento da historicidade do partilhante.

Após o recolhimento da historicidade do partilhante, o filósofo clínico iniciará o Exame das Categorias, que determinará a localização existencial da pessoa. Assim, os aspectos gerais em relação à sua cultura, crenças, ambiente, etc., serão entendidas pelo terapeuta. As categorias utilizadas na prática clínica derivam das categorias aristotélicas e são pragmáticas e complementadas a outras funções, à medida que são utilizadas para a obtenção do melhor daquele que traz suas angústias ao consultório, o partilhante. Elas são as seguintes: assunto, circunstância, lugar, tempo e relação. A categoria “assunto” aborda o assunto imediato (aquele que efetivamente leva o partilhante ao consultório) e o assunto último, que são as verdadeiras origens do problema, as causas mais profundas, que podem ou não relacionar-se com o assunto imediato. A categoria “circunstância” permite ao filósofo clínico entender o que se passa ao redor do partilhante em dado momento, as suas sensações, vivências, etc. A categoria “lugar” provê ao filósofo clínico a relação organoléptica do partilhante com o ambiente em que o mesmo se situa. Esse contexto sensorial pode estar ligado a diversos fatores, como uma cidade, uma situação e/ou diversos outros elementos. Já a categoria “tempo” trata tanto do tempo “objetivo”, efetivamente a cronologia ‘oficial’, do relógio e do calendário, quanto do tempo “subjetivo”, que relaciona-se com a pessoa de forma mais complexa, pois não está vinculado a priori com a necessidade de precisão temporal; não há quaisquer marcos que possam delimitar as fronteiras das fases em que a pessoa se situe no tempo. Um exemplo de tempo subjetivo é a abordagem de Santo Agostinho sobre o assunto: ele argumenta que o passado e o futuro inexistem, e que o presente é o “agora que passa”, dando-nos uma sensação de urgência e efemeridade. A categoria “relação”, por sua vez, busca fazer o “link” entre as circunstâncias narradas pelo partilhante com os significados que as mesmas possam ter, buscando com isso entender quais são os aspectos mais relevantes de tal narrativa. A importância será notada pelo terapeuta à medida que esses dados vão se mostrando menos ou mais importantes para o partilhante.

Outro elemento fundamental da Filosofia Clínica é o da Estrutura do Pensamento, que é absolutamente tudo que está na pessoa, como as emoções, os juízos, o raciocínio, seus anseios... A partir desses conceitos fundamentais, o filósofo poderá adiante elucidar seu entendimento a respeito do partilhante. Os elementos serão avaliados pelo terapeuta, baseado, sobretudo, na historicidade do partilhante, e o primeiro terá que discernir a devida importância de cada um, pois tudo se baseia na narrativa do partilhante e é impossível sabermos, com exatidão, todos os elementos que habitam aquela pessoa.

A Filosofia Clínica pensa a questão do Ser, e vai para além dos simples psicologismos quando adentra em questões existenciais. Há uma desconstrução, necessária, de conceitos "fechados" da medicina, como o conceito de "Loucura". Assim como a própria natureza do princípio da razão, que rege o bom fazer filosófico, a prática clínica procura entender o ser humano holisticamente, indo para além daquilo que poderia ser estigmatizado. A prática clínica possibilita ao terapeuta auxiliar o partilhante à medida que entende os seus pormenores, compreendendo sua própria história, sua forma de pensar e os conceitos e pré-conceitos nos quais se baseia sua performance para lidar com as questões fundamentais da vida.

Em suma, a Filosofia Clínica é uma maneira de fazer terapia a partir dos dois mil e quinhentos anos de História da Filosofia, sendo ela mesma uma Filosofia da Práxis. A terapêutica filosófica abstém-se dos preconceitos, das "loucuras" e patologias de praxe e certamente pode contribuir para que a existência do partilhante - e do terapeuta - na Terra seja mais prazerosa e, conseqüentemente, faça mais sentido.