Assisti hoje, pela segunda vez, o filme "The Zero Theorem". Ontem, ao sair do cinema, fiquei fascinado pelo fato pelo fato da obra ter me despertado reflexões e sensações tão importantes e que não sentia há bastante tempo, apesar de nunca de fato ter me desligado delas, desde o primeiro segundo em que as mesmas se instalaram em minha consciência. Podemos priorizar em nossa busca pela verdade a Epistemologia ou a Ética, mas nunca poderemos escapar das primeiras questões que a priori nos vêm à mente quando começamos a nos maravilhar com o mundo.
O personagem central, Qohen Leth, interpretado por Christoph Waltz
O filme desperta questões fundamentais da existência, como o sentido da vida, a finitude, os nossos papéis existenciais, e mais algumas coisas menos explícitas que nossa interpretação pode buscar, como a suposta automação de qualquer outro ser vivo terrestre que não seja humano, dentre outras sacadas que podem ser extraídas da obra. Pensar a respeito desses temas não é só importante como nos faz sentir maravilhosamente vivos, ante ao absurdo que toda a matéria representa simplesmente por existir. O filme nos incita a pensar a respeito de tantas improbabilidades que foram necessárias para que estivéssemos aqui nesse momento, a começar pela própria vida na Terra e desde o primeiro organismo unicelular que foi capaz de se reproduzir e, então, a cada acontecimento histórico, de qualquer magnitude, que foram condições improváveis e que, sem esse conjunto de improbabilidades, não estaríamos aqui desfrutando de todo esse absurdo e nos sentindo privilegiados em sermos capazes de perceber o mundo e contemplá-lo em êxtase. Ainda que todas as respostas que temos das fontes mais confiáveis, como a Filosofia e as ciências apenas nos aproximem do entendimento, a consciência de que nunca alcançaremos a coisa-em-si também é algo fascinante. Não precisamos criar gnomos no nosso jardim imaginário, ele já é naturalmente maravilhoso, elegante e belo.
O personagem central do filme é um homem transtornado, chamado Qohen Leth, que mora dentro de uma igreja abandonada (não poderia haver ambiente mais sugestivo) e que trabalha para uma empresa que o delega a missão de desvendar o Teorema Zero, o qual revelaria o início de tudo o que existe no mundo e, por conseguinte, o sentido de nossas vidas. O zero equivaleria a 100%, ou tudo que existe no universo, e Qoren, um gênio da matemática, só chega a números aproximados de 100, mas nunca desvenda completamente o teorema. Na prática, o teorema é real, mas ele simplesmente não consegue prová-lo. Qoren é um homem inquieto, que diz não sentir mais prazeres na vida e nada do que as pessoas costumam fazer o motiva. Ele alega que as festas, drogas, bebida, sexo e, enfim, todo tipo de prazeres são apenas paliativos fruto de nossa incompreensão daquilo que somos e do que estamos fazendo aqui. Ele vive angustiado e isolado porque, perto do absurdo da nossa existência, nada mais pode fazer igualmente sentido; então ele dedica sua vida de maneira obstinada a desvendar o mistério do teorema. Esse filme faz pensar o quanto a rotina convencional pode ser a própria destruidora de nossas vidas. Passar tanto tempo apenas fazendo planos ou gastando energia em coisas que não são realmente importantes para nós passa a ser uma decisão pouco inteligente.
Segundo o Dr. Peter Atkins, a Física contemporânea já chegou muito perto de desvendar a questão da origem da matéria, já que, segundo ele, a soma de toda a matéria existente tenderia a zero. Jean-Paul Sartre, em "O Ser e o Nada", alega que "o homem está abandonado na Terra, no meio das suas infinitas responsabilidades, sem ajuda, sem outros objetivos que não os que ele estabelece a si mesmo", e que "a vida nada é até ser vivida. Mas cabe-te a ti dar-lhe um sentido, e esse sentido nada mais é do que o sentido que lhe dás". Portanto, vá ao "Supermercado dos Sentidos", escolha o seu e desfrute da melhor maneira possível desta festa a qual não foi convidado: a vida.