A antropologia filosófica tem um quê de metafísica dentro do que se defina por antropológico; investiga a estrutura essencial do homem. O homem, por sua vez, conduz a especulação filosófica, já que todos os juizos nossos são necessariamente juizos humanos, provenientes de reflexões necessariamente humanas.
O modo de existir e de ser torna o homem acessível às realidades investigadas pela filosofia, e a transcendem no modo em que tudo parte de uma perspectiva humana. O ego, nesse caso, torna-se fundamental para essa concepção, já que ninguém pode sentir fora de si ou saber com exatidão como é a dor ou a impressão que outrem teve sobre uma mesma ação ou objeto. De fato, quando nos damos conta da igual limitação da própria linguagem, que é mera tradução dos nossos próprios pensamentos, nos pegamos numa situação de extrema limitação do entendimento. Na própria Filosofia da Arte temos que um mesmo objeto de apreciação tem diversas interpretações num mesmo homem – desde que em momentos distintos – o que diremos, então, de uma sensação externa a nós? Segundo Miguel Eugênio Almeida, da UEMS, “a concepção da língua como produto histórico-social implica, antes de tudo, a dimensão do homem como ser de linguagem e como ser social, no contexto da Antropologia Filosófica. O homem revela-se e revela a realidade do mundo perante a linguagem”. Ou seja, Ao relacionarmos a História da Linguagem com a Filosofia, estamos buscando o princípio do Ser; na Antropologia Filosófica, indagamos a posição do homem no mundo. Assim, a linguagem compreende a relação do homem com todas as coisas. A linguagem envolve o Ser em toda a sua plenitude, como diria Heidegger: a linguagem é a casa do ser. Isto é, o Ser está na linguagem e vice-versa. Tudo que o homem diz, faz ou pensa está presente à linguagem. É pertinente a relação da mesma (linguagem) com toda produção cultural humana. Trabalhamos mitos de entendimento a todo o tempo, pois não temos condições alguma de termos idéia de como as coisas são de fato – a coisa em si. Sentimos a necessidade de confiar na “ciência”, mas ela própria baseia-se na observação de causas e efeitos, a partir de estatísticas. Eis o método científico, que é o primeiro a ser incapaz de proporcionar respostas sobre a coisa em si. O próprio fato de confiarmos tanto na ciência parte de um mito, já que o agente receptor da informação não participa do método científico empregado para a aquisição dos seus resultados.
O que dizer, também, sobre o autoconhecimento? A frase do oráculo de Delphos, atribuída comumente a Sócrates, por tê-la proferido, permanece até hoje perturbadora. Como poderemos estar tão preocupados com o conhecimento factual do mundo e das coisas ao nosso redor se não conhecemos a nós mesmos? E mais, se o próprio autoconhecimento é algo distante, qual o conhecimento real que temos do mundo? Isso também nos leva à clássica problemática da cognição a partir dos sentidos – empirismo. Como poderíamos confiar nos sentidos para a aquisição do conhecimento, se os próprios podem ser os primeiros a nos enganar? Com a nossa tecnologia atual, de fato, sabemos que há diversas informações ao nosso redor que simplesmente não são captadas por nossos órgãos, como infravermelho, bluetooth, lasers, sons em determinados graus de agudo, sinais de rádio, entre outros. E, se antes o antropocentrismo nos mostrou que o homem é a medida de todas as coisas, hoje temos uma tendência biocêntrica, com o respeito pela vida como um todo. Cada vez mais nos vemos isolados num universo que parece extenso demais para nossa diminuta consciência. Dados progressivos mostram que a cada ano que passa, aumenta a quantidade de pessoas céticas. Sem religião. Nessas estatísticas, estão inclusos teístas, mas também o estão os agnósticos e os ateus. O homem do século XXI está descrente. Na vasta imensidão em que ele se encontra, busca sentido para o mundo. E para a própria vida. Sua própria existência foi questionada. O relativismo que tanto irritava Descartes foi vencido a princípio com a afirmação do pensamento. Com o trunfo do “penso, logo existo”, essa seria a primeira verdade absoluta: nossa existência! Contudo, filósofos posteriores mostraram que a coisa não era bem assim. Voltamos à estaca zero. Nossa nova tendência está agora vinculada à “invenção” contemporânea da perspectiva do ‘si mesmo’ – soi même – que na modernidade e nos tempos anteriores à mesma era ausente.
No século passado, a humanidade promoveu duas grandes guerras, instaurou diferentes sistemas econômicos, tentou melhorar o modo de produção capitalista... mas esbarrou na própria limitação do ego. Estivemos, por fim, a beira de uma guerra nuclear durante a guerra fria e hoje tenta-se promover o consenso de que as guerras são abomináveis, em detrimento da diplomacia racional. Contudo, a tecnologia que tanto reverbera nossa capacidade inventiva, ainda não foi capaz de dar um sentido absoluto à existência. Se “a técnica”, realmente, “desumanizou o homem”, é para nós agora imperativo que reconheçamos nossas limitações, juntar nossos cacos e seguir em frente. Continuamos na estaca zero, inclusive nos perguntando o que é que de fato somos, como Sócrates, há dois milênios.
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