domingo, 17 de março de 2013

Todo o sentimento

No cume tenebroso sempre certo,
Perturbado fico, logo d'antemão.
No vento assombroso que disperso,
Criando - n'outro vértice - a sucção.

Suga, sugando tudo no inferno,
Sem mostrar um só pingo de comoção.
Bate, soltando sentimento já liberto,
E somente vaga sofrendo retaliação.

Recuso-me a vestir o negro terno,
Desde que estremeço-me pela ambição.
Queimando o fogo em pleno inverno,
Sem hipótese de morrer num alçapão.

Pelo leito, de esperança fui coberto
Entre as aspas do que fala o coração...
E na evidência da energia sempre perto,
Almejo pela nova aurora sem intenção.

Já fraco, submeto-me ao deserto
Que a ausência converte em mim a emoção,
Tombando no mesmo céu aberto
Que outrora calava a minha solidão.

Embora vai a tumba de meus versos,
Na brevidade do tempo, no vigor d'um batalhão!
Renova a paz na fé do que seja eterno,
Refazendo todo o sentimento que corroía n'exaustão.

terça-feira, 12 de março de 2013

A obrigação dos ricos para com os pobres segundo Peter Singer



Alguns anos atrás, o Banco Mundial pediu a pesquisadores que ouvissem o que os pobres tinham a dizer. Eles conseguiram documentar a experiência de 60 mil homens e mulheres em 73 países. Repetidas vezes, em diferentes línguas e diferentes continentes, as pessoas disseram que a pobreza significava as diferentes coisas:
  • Você tem pouca comida durante o ano todo ou parte dele, muitas vezes fazendo uma refeição por dia,  às vezes tendo de escolher entre matar a fome do seu filho ou a sua própria, e às vezes não podendo fazer nenhum dos dois.
  • Você não consegue juntar dinheiro. Se um parente fica doente e é preciso dinheiro para levá-lo ao médico, ou se a colheita não vinga e você não tem nada para comer, é preciso pegar dinheiro emprestado com um agiota local - ele cobrará juros altos, a dívida continuará crescendo e talvez você nunca se livre dela.
  • Você não tem dinheiro para mandar seus filhos para o colégio, ou se eles entram no colégio, é preciso  tirá-los de lá novamente se a colheita for ruim.
  • Você vive em uma casa instável, feita de barro ou de palha, que necessita ser reconstruída a cada dois ou três anos, ou depois de cada intempérie.
  • Você não tem uma fonte próxima de água potável. É preciso carregar a água por um longo caminho e, mesmo assim, ela pode causar doenças, a menos que seja fervida.
Mas pobreza extrema não é apenas uma questão de necessidades materiais não satisfeitas. É muitas vezes acompanhada de um estado degradante de impotência. Mesmo em países democráticos e relativamente bem governados, os entrevistados do Banco Mundial descreveram uma série de situações em que tiveram de aceitar humilhações sem reclamar. Se alguém tira o pouco que eles têm e eles reclamam à polícia, é bem possível que esta não lhes dêem ouvidos. Assim como nada garante que a lei os protegerá contra estupro ou o assédio em geral. Há um sentimento difuso de vergonha e fracasso, porque eles não conseguem sustentar seus filhos. A pobreza os aprisiona, e os fazem perder a esperança de um dia sair de uma vida de trabalho do qual, no fim, nada resultará senão a mera sobrevivência. (1)

Segundo o princípio da igual consideração de interesses, defendida por Peter Singer, temos uma obrigação moral de ajudar alguém em necessidades, independentemente de este alguém ser o nosso vizinho ou uma criança desnutrida da Somália. Segundo dados atualizados da ONU, há hoje 1,4 bilhão de pessoas abaixo da linha da pobreza, ou seja, vivendo com menos de U$1,25 por dia. Até 2008, eram consideradas abaixo da linha da pobreza pessoas que ganhavam menos de U$1,00 por dia, porém os critérios que determinavam esse número tornaram-se em parte obsoletos e as contas precisaram ser refeitas.

Em países ricos, a relação com a pobreza é bem relativa. Nos Estados Unidos, segundo o Census Bureau, 97% dos considerados "pobres" tem televisão a cores. 75% dos "pobres" têm um carro na garagem, e a mesma proporção possui um aparelho de DVD. Não se está considerando aqui que uma pessoa pobre num país rico não enfrentem dificuldades reais, mas é factual que considerando-se os padrões de países do chamado Terceiro Mundo, eles seriam a elite financeira da população.

O total de 1,4 bilhão de pessoas que estão em estado de pobreza extrema hoje no mundo são pobres de acordo com um padrão absoluto, vinculado com as necessidades humanas mais básicas. É provável que passem fome ao menos uma parte do ano, e mesmo que consigam preencher o estômago, provavelmente serão mal nutridas, pela carência de nutrientes essenciais. Esse tipo de pobreza mata.

A universalização, para Singer, é fundamental para um agir ético coerente. Quando adota-se uma postura moral, deve-se considerar as questões do ponto de vista de todos que serão afetados. Isto significa que temos de nos colocar imaginariamente na posição deles, assim como na nossa, e de decidir o que fazer depois de dar tanto peso às suas preferências como que damos às nossas. Se fizéssemos isso relativamente às pessoas mais pobres que vivem nos países menos desenvolvidos, veríamos o quanto gastamos com supérfluos que podem muito bem serem revertidos em saciedade das necessidades básicas de outras pessoas, e isso pode fazer uma grande diferença às pessoas miseráveis no mundo. Se déssemos aos interesses desses pobres o mesmo peso que damos aos nossos, como deveríamos fazer, daríamos dinheiro a organizações que ajudam essas pessoas a superar sua pobreza e a tornarem-se auto-suficientes.

Peter Singer defende que é moralmente inaceitável um abastado gastar bilhões para ser mandado para fora da órbita terrestre pela NASA, ou gastar algumas centenas de milhões num iate poluidor com submarino e heliporto, enquanto, por outro lado, o UNICEF estima que centenas de milhares de crianças que ainda morrem de sarampo a cada ano poderiam ser salvas por uma vacina que custa menos de U$1,00 a dose. Em seus prospectos, a Nothing But Nets - organização concebida pela NBA - que tem projetos para proteger crianças da malária, menciona que "se você doar U$100 para a Nothing But Nets, estará salvando dez vidas", isto é, para cada dez dólares doados, em média, uma vida pode ser salva. Há diversas ONGs fazendo um bom trabalho, e existem ONGs paralelas que fiscalizam a eficiência de como o dinheiro é aplicado por elas, fornecendo detalhes e tornando a doação transparente. Infelizmente, a denúncia de certas ONGs fraudulentas atrapalham o trabalho de ONGs sérias, que fazem um trabalho efetivo no objetivo de eliminar a pobreza mundial.(1)


Seguindo esse raciocínio, é importante que possamos criar uma cultura de doação, e Singer sugere que isso pode ser feito baseando-se proporcionalmente em relação à renda anual de cada pessoa em condições de doar. Uma força-tarefa das Nações Unidas estimou quanto custaria eliminar a pobreza mundial a partir da realização de seus projetos. A força-tarefa se baseou em avaliações preliminares feitas em Bangladesh, Camboja, Gana, Tanzânia e Uganda, que indicaram que os objetivos de desenvolvimento poderiam ser alcançados por um custo per capita de U$70 a U$ 80 em 2006, aumentando à medida que os projetos são gradualmente ampliados, para U$120 a U$160 em 2015. A partir disso, a força-tarefa chegou a uma estimativa global de U$121 bilhões em 2006, subindo para U$189 blhões em 2015. Baseado nisso, Singer calcula quanto de cada pessoa rica precisaria doar para a eliminação da pobreza mundial, numa soma combinada. De acordo com o Branko Milanovic, do Banco Mundial, se definirmos "ricos" como aqueles que têm uma renda acima da renda média e Portugal (o país com a menor renda média no "clube dos ricos" da Europa Ocidental, América do Norte, Japão, Austrália e Nova Zelândia), então há 855 milhões de pessoas ricas no mundo. Se cada um destes ricos doasse apenas U$200, isso perfaria U$ 171 bilhões (aproximadamente a quantia que a força-tarefa das Nações Unidas acredita ser necessária a cada ano para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio.(1)


Porém, Singer tem metas mais ousadas, baseada na divulgação da necessidade de uma cultura de doação - o próprio Singer contribui com 20% de todo o seu rendimento - que leva em conta não valores absolutos per capita para uma quantia global, mas o rendimento factual de cada um. Ou seja, aqueles chamados "super-ricos" teriam de doar muito mais do que aqueles que estão só um pouco acima da média do critério estabelecido.

(1) SINGER, Peter. Quanto custa salvar uma vida? Agindo agora para eliminar a pobreza mundial. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010.

terça-feira, 5 de março de 2013

Seria o homem naturalmente místico?



É bem verdade que a Filosofia, bem como, mais tarde, a ciência secular, permitiram à humanidade alcançar níveis de entendimento a respeito do universo e tecnologias sem precedentes, antes inimagináveis. Ao ponto de desenvolvermos uma cultura mais complexa em relação aos outros animais e, até mesmo, ter a postura soberba de que o nosso desenvolvimento tecnológico nos faz diferentes dos outros animais; mito que foi propagado também pelas religiões de todo o globo em suas relações cíclicas onde o Antropocentrismo é o próprio fundador do Teocentrismo, já que todos deuses são reflexos de seu povo. Essa crença só foi por terra definitivamente no século XIX, devido aos trabalhos de Charles Darwin.

Ouvimos, desde crianças, que "o homem é um animal racional". Da maneira como se propaga esta afirmativa aristotélica, ela virou um verdadeiro mantra - que, aliás, é extremamente questionável nos nossos dias, em que conhecemos melhor outros animais e suas capacidades, bem como o próprio conceito de racionalidade também não é algo que se possa atribuir universalmente à nossa própria espécie. Hoje, graças ao secularismo, podemos buscar a compreensão das coisas e entendê-las, ao invés de pura e simplesmente acreditar sem questionamentos, baseando-nos em alguma mitologia escolhida, ainda que o conhecimento verificável - seja o filosófico, através do princípio da razão e da lógica, seja o científico, através de suas nuances empíricas e probabilísticas - seja fundalmentalmente revisionista por princípio e necessidade, já que só algo eternamente em construção e questionamento pode ter alguma credibilidade perante o juízo de seus próprios princípios, dando sentido àquilo que por ventura se conclui.

Contudo, o esforço que é necessário para atingirmos tal patamar é titânico. É um trabalho constante, que se relaciona com todas as áreas do conhecimento na busca de levar o pensamento científico para a sociedade como um todo, tendo como a maior ferramenta de todas a Educação. Todavia, o conhecimento racional continua limitado a ciclos acadêmicos e científicos muito restritos, que não é capaz de atingir a sociedade como um todo. E ainda há o agravante de que, na sociedade capitalista, o conhecimento técnico (ainda que com o status de universitário, em alguns casos) seja o mais viável para aquele que deseja se bem posicionar na comunidade. O sistema econômico ajuda a marginalizar o pensamento acadêmico e a ciência acabou se tornando refém do financiamento de grandes grupos econômicos que geram tecnologias robóticas, produzindo ciência como se ela fosse uma filha bastarda das Humanidades. Para Platão e os pitagóricos, a intuição, apesar de ser um conhecimento inferior, também pode ser considerado válido sob determinadas condições, como nas relações sensoriais e na matemática. E, através dessa intuição empírica, percebo que a condição natural do homem caminha em paralelo com esse conhecimento verificável. O homem comum do nosso tempo, mesmo com todas as conquistas do pensamento racional, goza de todas as benesses das ciências, mas em geral não as compreende e até mesmo se opõe aos seus princípios. Nesse aspecto, nosso mundo "ainda é rodeado de deuses e mitos", e temos os mesmos desafios daquele primeiro filósofo de Mileto que ousou pensar o mundo para além do mitológico - ainda que não completamente desvencilhado dele. Hoje, nossos termos são outros. Religiões fracassadas são consideradas "mitologias", restringindo o termo aos casos antigos, sendo o mesmo utilizado na tentativa de diferenciar as religiões que ainda possuem fiéis. A superstição é, ainda, predominante em todas as sociedades.

Ainda que não possamos afirmar de maneira apodídica que o homem é religioso por natureza, intuo que lutamos uma batalha perdida. Temos a capacidade de raciocinar, mas potência não torna-se necessariamente ato. Se é fato de que, em tese, todos os seres humanos saudáveis são capazes de raciocinar, isso não torna esses mesmos entes em seres pensantes de maneira automática. Talvez a nossa verdadeira realidade, aquela que acontece naturalmente, sem esforços, seja a do homem mítico, que desenvolveu a inteligência para além dos outros animais, se espantou com o que viu, voltou para a caverna e, dentro dela,  sua inteligência incipiente foi capaz de povoar seu mundo de magia, acalmando-lhe a alma. Talvez os seculares, humanistas e os filósofos (não me refiro nesse caso aos decoradores da História da Filosofia) sejam aqueles que continuam fazendo o papel do libertário que vai de encontro à luz - e que talvez, ao contrário do que sonham alguns, essa "luta" seja de encontro à nossa própria natureza. 

sábado, 16 de fevereiro de 2013

No terraço existencial

Está na hora de retornar ao terraço existencial
Contemplando a solidão da Lua
E, ao contemplar a imensidão,
percebo que também sou Lua.

O carnaval em mim se foi
Quando, talvez, nunca tenha sido.
E a carta que deixa é o pó
Que amedronta de destruição os sonhos vivos.

Não quero mais pensar em dor
Excluí-las-ei por decreto,
Ainda que abdicando de sinceridade.

Não tenho opções saudáveis a escolher,
Mas permaneço em vigília pela vida...
E, nas entranhas, a cultivarei eternamente.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Filosofia Clínica: uma Filosofia Aplicada



A Filosofia Clínica parte do pressuposto de que não há pressupostos na existência humana. Investe no princípio de unicidade humana, em que o individual é valorizado em detrimento dos chavões comuns e da "ditadura" subliminar de uma ética comportamental para todas as pessoas.

Inicialmente, os estudos da personalidade do partilhante, como é chamado aquele que leva suas questões existenciais, angústias, etc., ao Filósofo Clínico no consultório, são extraídos a partir da historicidade do indivíduo, que é estudada minuciosamente para que haja uma espécie de "banco de dados" que possam ajudar o profissional a entender as motivações do partilhante, seu universo, sua estrutura de pensamento, suas angústias, suas crenças, enfim, tudo o que é pertinente e que seja possível entender através do conhecimento da historicidade do partilhante.

Após o recolhimento da historicidade do partilhante, o filósofo clínico iniciará o Exame das Categorias, que determinará a localização existencial da pessoa. Assim, os aspectos gerais em relação à sua cultura, crenças, ambiente, etc., serão entendidas pelo terapeuta. As categorias utilizadas na prática clínica derivam das categorias aristotélicas e são pragmáticas e complementadas a outras funções, à medida que são utilizadas para a obtenção do melhor daquele que traz suas angústias ao consultório, o partilhante. Elas são as seguintes: assunto, circunstância, lugar, tempo e relação. A categoria “assunto” aborda o assunto imediato (aquele que efetivamente leva o partilhante ao consultório) e o assunto último, que são as verdadeiras origens do problema, as causas mais profundas, que podem ou não relacionar-se com o assunto imediato. A categoria “circunstância” permite ao filósofo clínico entender o que se passa ao redor do partilhante em dado momento, as suas sensações, vivências, etc. A categoria “lugar” provê ao filósofo clínico a relação organoléptica do partilhante com o ambiente em que o mesmo se situa. Esse contexto sensorial pode estar ligado a diversos fatores, como uma cidade, uma situação e/ou diversos outros elementos. Já a categoria “tempo” trata tanto do tempo “objetivo”, efetivamente a cronologia ‘oficial’, do relógio e do calendário, quanto do tempo “subjetivo”, que relaciona-se com a pessoa de forma mais complexa, pois não está vinculado a priori com a necessidade de precisão temporal; não há quaisquer marcos que possam delimitar as fronteiras das fases em que a pessoa se situe no tempo. Um exemplo de tempo subjetivo é a abordagem de Santo Agostinho sobre o assunto: ele argumenta que o passado e o futuro inexistem, e que o presente é o “agora que passa”, dando-nos uma sensação de urgência e efemeridade. A categoria “relação”, por sua vez, busca fazer o “link” entre as circunstâncias narradas pelo partilhante com os significados que as mesmas possam ter, buscando com isso entender quais são os aspectos mais relevantes de tal narrativa. A importância será notada pelo terapeuta à medida que esses dados vão se mostrando menos ou mais importantes para o partilhante.

Outro elemento fundamental da Filosofia Clínica é o da Estrutura do Pensamento, que é absolutamente tudo que está na pessoa, como as emoções, os juízos, o raciocínio, seus anseios... A partir desses conceitos fundamentais, o filósofo poderá adiante elucidar seu entendimento a respeito do partilhante. Os elementos serão avaliados pelo terapeuta, baseado, sobretudo, na historicidade do partilhante, e o primeiro terá que discernir a devida importância de cada um, pois tudo se baseia na narrativa do partilhante e é impossível sabermos, com exatidão, todos os elementos que habitam aquela pessoa.

A Filosofia Clínica pensa a questão do Ser, e vai para além dos simples psicologismos quando adentra em questões existenciais. Há uma desconstrução, necessária, de conceitos "fechados" da medicina, como o conceito de "Loucura". Assim como a própria natureza do princípio da razão, que rege o bom fazer filosófico, a prática clínica procura entender o ser humano holisticamente, indo para além daquilo que poderia ser estigmatizado. A prática clínica possibilita ao terapeuta auxiliar o partilhante à medida que entende os seus pormenores, compreendendo sua própria história, sua forma de pensar e os conceitos e pré-conceitos nos quais se baseia sua performance para lidar com as questões fundamentais da vida.

Em suma, a Filosofia Clínica é uma maneira de fazer terapia a partir dos dois mil e quinhentos anos de História da Filosofia, sendo ela mesma uma Filosofia da Práxis. A terapêutica filosófica abstém-se dos preconceitos, das "loucuras" e patologias de praxe e certamente pode contribuir para que a existência do partilhante - e do terapeuta - na Terra seja mais prazerosa e, conseqüentemente, faça mais sentido.

sábado, 29 de dezembro de 2012

Confissão de um vício

Acredito que nunca escrevi em primeira pessoa neste blog. Não que eu me lembre. Mas agora, não vou escrever algo relacionado à Filosofia ou postar uma poesia. Vou confessar um vício que tenho desde criança. Eu me permito uma dose diária de alienação, quase uma morfina. Todos os dias, é uma tradição pessoal. Imagino um mundo perfeito, em que todas as pessoas são felizes e têm suas reais necessidades supridas; que todas as pessoas são amorosas, honestas e solidárias; imagino um mundo em que nós não precisamos desconfiar das pessoas e que ninguém queira tirar proveito de ninguém; imagino um mundo de pessoas que, ainda que não consigam ser simpáticas, sejam educadas e cordiais. Às vezes esse mundo sequer tem fronteiras, e não há sequer necessidade de afirmar-se a igualdade, já que para todos isso é uma condição moral básica. Desnecessário dizer que inexiste até mesmo a palavra "hierarquia" ou "autoridade". Imagino um mundo maravilhoso em que as pessoas não são ridicularizadas por sonhar e lutar por aquilo em que acreditam; e ainda que cada um saiba que é responsável por aquilo que faz e que suas conquistas são méritos próprios e não de divindades imaginárias. É claro que em algum grau eu também me moldo nessa fantasia. E também é imperativo que após descer do pedestal dos sonhos, eu deva me deparar com a realidade para que eu tente ser mais um agente transformador de alguma maneira. Mas esse meu mundo imaginário me ajuda a seguir em frente e me permite não sufocar em momentos de maiores angústias frente à desesperança na maneira pela qual o mundo se apresenta em sua versão mais crua para mim.

domingo, 11 de novembro de 2012

Paralelas

A cada lua
Em carne tua
De suave amônia
Que gera insônia...

Em cada noite
Que gera o açoite
Desprezo da ausência
Lacônica consciência...

A dor é crua
Na minh'alma nua
Lembrança errônea
Qu'é prata e sonha...